UM
VISITANTE INESPERADO
Costume dizer a jeito de brincadeira,
para lhe animar, que é mais fácil perguntar-lhe do que ela não sofre...
Bem voltemos à crônica, sempre fui
devoto de Nossa Senhora e há certa de um ano fui convidado pela Sra. Emiliana para
um presidium, ela apenas disse que precisava de mim, disse-me o local e a hora
do encontro, Capela de Lém Ferreira, Sábado, às 07H30. Eu já tinha notado
aqueles movimentos de pessoas sempre no mesmo dia e hora, não sabia do que se
tratava, mas eu estava morto de curiosidade, e, ia ter a oportunidade de saber
do que se tratava. Não fui naquele
sábado, já tinha outro compromisso, fui uma semana depois. Vi a alegria no rosto dela e senti que a
mesma já estava a pensar que perdeu o seu tempo ao convidar-me. Vi logo que era
LEGIÃO DE MARIA, desde menino que eu sabia que ela existia. Pois aprendi a
recitar “quem é esta que avança como
aurora formosa como a lua, brilhante como o sol, terrível como o exército na
hora da batalha?” entre o soneto de Bocage sobre a fábula da raposa e a uva
verde e a fala dos animais de Júlio Dinis e mais alguns poemas de autores
desconhecidos.
Entrei para a Legião, a minha mulher
estava no exterior em... Imaginem... “Check-up”.
Assim que ela chegou tive o trabalho de levá-la e hoje estamos os dois no
Presidium de Nossa Senhora de Carmo de Lém Ferreira... Devia ser de Fátima, mas a Nossa Senhora é a mesma.
Chegou a minha vez de iniciar a
Oração e fazer a leitura, fiz o melhor que pude entre a ansiedade e o
nervosismo...
No fim da reunião o Presidente, Irmão
José da Lomba disse-me que estava a pensar em algo para mim. Hoje sei que é
ficar temporariamente “presidente” enquanto ele sairia de férias e tratamento
em Portugal. Não pude negar o pedido, sei que não estou preparado, mas não tive
coragem de dizer não.
Já presidi algumas reuniões, claro
com ajuda de todos os membros, eu o mais novo do grupo com exceção da minha
mulher que também se encontra ausente. Já presenciei uma reunião de Régia e
tudo me parece aliciante e belo no projeto de Frank Duff. Brevemente irei fazer
a minha primeira visita à um Presidium na Achada Grande Trás, mais um passo em
frente.
Já sabíamos do passeio legionário de
este ano na Paróquia de S. João Batista e na localidade do mesmo nome. Mas na Régia
recebemos a informação que iria ser na mesma Paróquia, mas a localidade foi
transferida para Santa Ana. Uma Santa muito respeitada em S. Tomé onde a
tradição dá um valor enorme aos avôs e sendo Santa Ana a Avó humana de Jesus,
ela é elevada a “SANTANA GRANDE”.
Resolve na nossa reunião semanal,
sábado, 04 de Julho, que devia ir ao passeio, seria este ou jamais iria como
aconteceu no ano passado. Entre no grupo uma semana antes do passeio de 2014,
não achei que devia participar num passeio, estando a minha mulher ausente.
Domingo, cinco de Julho de 2015, Cabo
Verde em festa, 40 anos de independência e nós íamos fazer a nossa festa de
2035 anos de Maria, Nossa Senhora, mais anos menos anos.
Às 08H30 cheguei ao ponto combinado.
Encontrei o carro do outro Presidium de Lém Ferreira cheio e o nosso? Estava
lá, mas contei, éramos apenas quatro. Tenho no espírito um pouco de S. Tomé, senti
um pouco tremido a participação do nosso grupo. A desilusão começa a
aparecer... E comecei a pensar que não fui suficientemente eloqüente para
convencer os membros a participar. Chega a Irmã Narcisa e pergunta pelos que
faltam. Resolve ir chamar o Irmão Lucio e regressa ela e ele e a família. Irmã
Lurdes e a neta de dez anos. Menos mal, pouco depois chega uma das irmãs que desculpara
e afirmara não poder ir. Senti-me privilegiado com esta surpresa. Mas faltava a
pessoa mais importante, a Irmã Celeste tesoureira, sem ela nada feito, é a Irmã
do cofre, mas ela chega um pouco depois. Que alivio... O Irmão Luís Vicente não
confirmara, apesar da insistência, compreendi, ele vinha de uma longa viagem.
Ainda estava a acertar o relógio para o de Cabo Verde.
Partimos rumo ao ponto combinado pela
Régia, arredores do Mercado de Sucupira. Ainda tivemos a oportunidade de
apanhar uma Irmã do outro Presidium de Lém Ferreira, ela atrasou-se um pouco e
regressava ao lar com desilusão no rosto. À titulo de brincadeira dê-lhe ordem
para mudar imediatamente para o nosso Presidium que nós nunca esqueceríamos
dela. Serviu para todos rirem descontraidamente.
Chegamos ao ponto. Vários Hiaces
estavam ai e algumas pessoas que ainda não tinham como deslocarem. O nosso
carro encheu rapidamente e “expulsamos” a Irmã que demos a boleia para o grupo
dela, o Hiace do outro grupo estava lá. Fizemos pequenas compras de última hora e
partimos, ao todo seis Hiaces... No nosso rezamos um terço e cantamos, a Irmã
Emiliana presidiu o terço. O momento de Fé era atrapalhado por curtos momentos
de curiosidade, era a minha primeira ida a Santa Ana. Eu não era único, a
menina de dez anos, neta dos irmãos Lúcio e Lourdes queria saber o nome de
todos os aglomerados habitacionais por onde passávamos.
A estrada não era das melhores,
depois de o alcatrão tomar conta das antigas calçadas de “paralelos em
basáltico”, andarmos numa estrada destas passou a ser um sacrifício, mas só
víamos a notar no regresso e nem tanto.
Chegamos mesmo à tempo. A missa ia
começar, o Senhor Padre, um Franciscano, que nos convidou, estava a ensaiar os
cânticos da missa e por fim levantou-se e deu-nos boas vindas. Ele Informou-nos
que de momento era único, os outros padres por contingência humana tiveram que
ausentar, um é moçambicano e tinha o passaporte caducado, outros, por outras
razões ausentaram.
“Não há mal que vem sozinho” não sei
que o disse pela primeira vez, mas acontece com certa freqüência, que julgo
confirmada a tese. Ele tinha entalado um dedo na porta do carro... Dormiu mal e
chegou tarde, depois de ter que estacionar a berma da estrada para descansar um
pouco, pois corria o risco de dormir ao volante... A missa ia ter cânticos, mas
sem o piano, pois sozinho não podia presidir a cerimônia e tocar o piano... Era
incapaz de fazer o milagre da duplicação e houve o milagre, o presidente da Régia,
Irmão Juvenal Tavares é um nato músico a tocar e a cantar... Embora não fazia
ainda parte da cena, e a dançar. Os cânticos tiveram acompanhamento do piano.
Entra a visita dos visitantes. Uma
visita inesperada. O senhor Manuel, ia dentro de um caixão e como manda a
tradição o afilhado mais novo ia à frente de lenço branco um uma CRUZ DE CRISTO
envolto num pano de mesma cor. Ele esteve na agonia cerca de três meses e
morreu precisamente na véspera da nossa visita, isto vim, a saber, depois pela
irmã Filoca na partilha da palavra semanal.
Teve a sua missa de corpo presente e
soubemos pelo padre que comungou duas semanas antes. Merecia estar presente e
ser a nossa visita.
Terminou a missa, mas o senhor Manuel
continuou deitado dentro do seu caixão à espera do filho emigrante... Que
fazer? Rezar por ele, e, o passeio de alegria
transformou-se num ato de misericórdia fúnebre. O irreverente Irmão Jhonsa fez a abertura
da cerimônia com terço, teve a ajuda do Irmão Domingos.
Fomos recebidos de CUZ-CUZ COM LEITE,
servimos, não chegou para todos, mas todos se sentiram saciados e agradecidos.
Cada presidium tinha seu plano de
almoço, o nosso não tinha e improvisamos e juntamos com alguns na mesma
situação e com os nossos anfitriões. Foi lindo.
Depois do almoço tiramos algumas fotografias. Perguntei ao Irmão Juvenal
o que era a próxima atividade. A resposta foi:
-Com a presença do senhor Manuel o ambiente não é propicio...
-Com a presença do senhor Manuel o ambiente não é propicio...
-Se o senhor Manuel escolheu
visitar-nos é porque assim quis a nossa senhora – o Irmão Domingos disse e
levantou-se. Fomos rezar de novo e o Irmão Juvenal fez uma reflexão da vida e
da morte que o momento exigia.
Fiquei sem saber se o esperado filho
do Senhor Manuel chegou ou não. Pois o
cortejo fúnebre seguiu para sua última morada. Segundo soube, muito distante da
localidade de Santa Ana.
Esperamos o tempo necessário de
respeito que o senhor Manuel e a família merecia afastassem à caminho do
destino final do nosso corpo e voltamos para a Nossa Mãe na Casa feita em honra
da Mãe da Nossa Mãe, desculpem o pleonasmo...
Que linda festa. Lembrei-me da minha
juventude na Igreja em S. Tomé e Príncipe.
Os cânticos podem se transformar é louvor e alegria e em vários estilos
de musicas, desde o nosso Funana até ao ritmo popular português. Cada um com o seu talento que fez render o
máximo. Se fosse um concurso tradicional da cultura, não sei quem ficaria em
primeiro lugar.... O Irreverente Jhonsa ou o animador Domingos ou o completo
Juvenal ou um jovem que vi pela primeira vez ou uma das irmãs de 70 e tais
anos. Não era preocupante, tinha a minha medalha, o pior de todos a dançar e a
cantar. Mas não guardei meu péssimo talento, com medo das gargalhadas que
provadamente provoquei...
Tivemos a preciosa ajuda de Irmã
Missionária para nos animar. O tempo voou e chegou a...
Hora de regresso e onde está o
fundador da Legião em Santa Ana, com ajuda do muitíssimo conhecido Padre
Campos? O Senhor Nicolau. As “nossas
anfitriãs nos informaram que naquele dia ele não pode descer...” Se ele não vem
a nós, vamos nós a ele.
Depois das últimas fotografias da
Família da Legião, fomos conhecer o ancião de oitenta anos e o Irmão Juvenal
fez de jornalista e eu? Porque não o “câmara-man” improvisando? Até um telemóvel se transformou num microfone.
Restam apenas o abraço, a vontade de
regressar de novo, não faltou o convite, e o regresso à casa... Cheios de saudade.
João Pereira Correia Furtado
Praia, 06 de Julho de 2015
http://joaopcfurtado.blogspot.com