quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

A CASCATA DA ÂNGELA

A CASCATA DA ÂNGELA


O mundo não é uniforme e perfeito. A desigualdade é flagrante. Tanto a Natureza como todos os seres vivos que neste planeta habita têm virtudes e defeitos. Há terra onde o mel e o leite brotam das rochas. De outro lado há terra que nem o orvalho nas madrugadas frias junta nas inexistentes folhas verdes. Terra onde tudo é seco e tórrido.
A Ângela vivia numa terra onde a areia e a seca eram duas irmãs de mãos dadas. A água, que é cerca de 75% do planeta terra era escassa e para a possuir era preciso longas caminhadas. Entretanto com o esforço lá se conseguia a quantidade necessária para sobrevivência. Mas toda a pouca água que se conseguia ficava pelo lado norte da terra. Pelo sul, nada, nem uma gota…
Ela vivia com o pai e a mãe. De repente sem se saber como a mãe morreu. Foi uma enorme tristeza. Pensavam que iam morrer, mas aos poucos a vida se retomava e tornava normal. Fui ela quem adoeceu.
O pai da Ângela não podia perder a única família que tinha. Desesperado foi falar com um sábio homem, já velhote e de grande reputação. O sábio depois de muito estudar e falar com as estrelas e o além, deu-lhe a resposta.
- Tens que ir procurar a água da rocha sul e trazer. Se deres de beber a água da rocha sul à tua filha, ela salvar-se-á. Pega numa bilha de barro e numa picareta e vai até ao sul. Quando lá chagares pegue na picareta e cava até encontrares a água. Coloca na bilha e tragas para a tua filha. Não deves beber nem uma pinga dela.
- Mas… Senhor Sábio, para o sul tudo é tão seco…
- Ou acreditas e salvas tua filha ou ela morre!
- Eu darei até a minha própria vida para salvar a minha filha, irei!
- Não sabes a verdade que acabas de dizer! – Enigmático o Sábio afirmou.
 O pai pegou a bilha e picareta e partiu para o sul até encontrar a rocha. Passou toda a manha a cavar, já perto das 14 horas sentiu algo molhado. Da rocha escorria umas gotas de água. Ele  recolheu o que foi possível e o mais rápido que podia regressou para trazer o precioso líquido à filha. Ele sentia tanta sede que parecia que ia desmaiar-se a qualquer momento. Pereceu sentir que de onde as miseras gotas saíram, brotava água e muita água, uma autêntica cascata. Não voltou.
Continuou a sua caminhada… Cada vez com maior dificuldade. Mas foi, foi, aos poucos até chegar perto da Ângela.
Encontrou a Ângela fraca mas na rua junto a um murro onde se suportava com dificuldade. Entregou-a a bilha de barro:
- Toma filha – disse em esforço – bebe!
A Ângela tomou e bebeu. Revigorou-se e voltou o rosto para o pai a sorrir… Abriu a boca para lhe agradecer com um “obrigado pai” não foi possível, o pai estava no chão. Tinha acabado de perder a vida. Morreu por ela.
Era mesmo uma cascata que nascera ao sul. Uma cascata que foi dado o nome de Ângela. A rocha do sul nunca mais deixou de brotar água das suas entranhas. Mas sem as propriedades curativas que teve nas primeiras gotas desapareceram.                 

João Pereira Correia Furtado
Praia, 09 de Janeiro de 2015